quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Caipira

TaRde!

Acho que o que mais me incomoda quando viajo para o Nordeste e para o Rio é ouvir que paulista não gosta de nordestinos e que paulixta é tudo de ruim. Para ser bem objetivo, se as pessoas soubessem a diferença entre paulista e paulistano as coisas ficariam bem mais claras e menos enfadonhas. Para entendermos melhor quem é quem, o primeiro remete ao sujeito nascido no estado de São Paulo, enquanto o segundo é o nascido na cidade de São Paulo. Portanto, todo paulistano é paulista, porém, nem todo paulista é paulistano. 
São Paulo, capital, pode ser A Capital, mas não é O Estado de São Paulo todo. Aliás, o único "lugar" que ainda preserva traços de uma Cultura (ainda que in vitro) do que fora o estado de SP é o Interior. O cosmopolita, paulistano, remete a outro sujeito, o da metrópole, um sujeito multifacetado culturalmente, em sincretismo constante, mas não ao paulista original.
Quando disserem que paulista não gosta de nordestinos, não se esqueça que o paulista também é gente simples e humilde do interior do estado, e não tão somente o cosmopolita da capital. Portanto, paulistano é da capital, e Paulista é do Estado.
O paulistano tende a centralizar toda sua percepção de mundo no contexto da capital, ignorando a realidade de seu próprio estado; pelo menos as gerações mais recentes.
Como se não bastasse todo esse desconhecimento e confusão, o sujeito interiorano de SP é tratado e visto como uma figura folclórica, quase mítica, o dito caipira. Porquanto, vamos esclarecer alguns equívocos.

Isso é um caipira de verdade, de raíz, original:
Caipira Picando Fumo do pintor de Itú, Almeida Junior.


E isso é uma figura estereotipada que não confere com a realidade em tempo algum; "sertanejo-pop-universitário-esporádico-teen". Produto da mídia. Dá revertério só de olhar. É um tipo de Restart neo-caipira:

E abaixo, os maiores representantes da cultura caipira no país todo: Tonico e Tinoco. Consagrados por sua autenticidade, simplicidade, originalidade e carisma.
Música caipira não deve ser confundida com música sertaneja, mesmo porque não há sertão no estado de São Paulo.

É certo que a imigração massiva de italianos "estragou" o Português da região, mas também ajudou a criar um sujeito sincrético, novo. A exemplo disso, palavras como "pregunta" e "despois", presentes no vocabulário do dito matuto compunham a norma culta do Português dos últimos bandeirantes, que se fixaram no interior de SP.
O sotaque interiorano de SP pode parecer engraçado para o "forasteiro", assim como o sotaque carioca soa irritantemente chiado para outrem. Bem, cada um na sua, mas com alguma coisa em comum.

Um caipira interpretado pelo ator e cineasta Amácio Mazzaropi, numa comédia.



Havia também um folclore riquíssimo do interior de SP, já quase completamente esquecido. Lembro da minha avó, irritada, me chamando de Cavalão das Almas quando eu aprontava alguma traquinagem:

No estado de São Paulo, o Cavalo das Almas anda pelas estradas em busca de pessoas recém-falecidas que o esperam nos moirões das porteiras. Quando as encontra, elas montam em sua garupa e, então, partem juntos para local desconhecido. Fonte: Fantastipedia

As histórias de assombração eram assustadoras. O Exorcista era fichinha!
Agora me diz: depois da globalização, onde é que pode-se encontrar um caipira de verdade hoje em dia? Em causos? No imaginário coletivo do paulista da metrópole?
Tá vendo, nem tudo em SP é poluição, stress, crime e violência. E ainda sabemos que abacaxi não dá em árvores e que galinha não tem dente.

3 comentários:

  1. Nem ficamos boquiabertos ao encontrar um cavalo num hotel fazenda e apontando pra ele como se tivéssemos visto um unicórnio. "Que legal, não é que eles existem mesmo?" :p

    ResponderExcluir
  2. Hahaha... cara, isso é triste. Pobres seres da metrópole.

    ResponderExcluir
  3. O que me causa pena é o fato de uma cultura tão rica estar hoje em dia quase que extinta. A cultura do caipira foi arrancada pela cultura do cowboy e o sertanejo verdadeiro caiu no esquecimento.

    ResponderExcluir